As vendas digitais de automóveis são discutidas há anos como uma grande tendência do setor automotivo. No entanto, essa ainda não é a maneira preferida de vender e comprar carros: dados recentes mostram que 8 em cada 10 brasileiros ainda preferem ir à loja finalizar a compra de um veículo. Mas será que a crise da Covid-19 poderá mudar esse comportamento?

Para conter a transmissão da doença, muitas unidades da federação resolveram fechar, ao menos temporariamente, o comércio, o que impactou diretamente lojas de veículos, peças e acessórios e toda a cadeia automotiva brasileira (incluindo a produção).

Mas o impacto no setor automotivo já é global. O fechamento do comércio durante a segunda quinzena de março  levou a uma redução média de 20% nas vendas de veículos, tanto no Brasil quanto na Europa e nos Estados Unidos.

Paralelamente, a intensidade de uso do comércio eletrônico e de alguns serviços de delivery vem aumentando. 

De acordo com a pesquisa “Impacto nos hábitos de compra e consumo” da Opinion Box, realizada nos primeiros dias de abril de 2020, serviços como farmácia online/delivery, supermercado online/delivery e delivery de comida estão no ranking dos serviços que tiveram uso intensificado pelos usuários.

A JD Power, uma das principais consultorias automotivas do mundo, também aposta que  os serviços de compra e entrega de veículos online aumentarão nos próximos meses. Essa tendência é causada, principalmente, pela quarentena. 

“Estamos esperando por isso. A maioria das peças está no lugar”

Tyson Jominy, vice-presidente de dados e análises da JD Power, sobre o potencial aumento no varejo online de automóveis. Entrevista concedida à Wards Auto

A consultoria acredita que a maioria das fabricantes ou revendedores será capaz de oferecer  um veículo, uma peça ou acessório ou mesmo um serviço automotivo com o mínimo de interação pessoal durante a pandemia — totalmente online.

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E isso será necessário. Se, antes, 96% da jornada de compra no setor automotivo era percorrida online e finalizada na loja, hoje é possível que esse comportamento mude. Mesmo na China, onde os números de contágio começaram a cair e Wuhan, epicentro da pandemia, saiu quarentena, muitas pessoas ainda estão com medo de voltar a sair na rua

É possível que o consumo, portanto, retorne, mas de uma forma diferente.

O medo deverá substituir a conveniência como motivador das vendas digitais de automóveis. Agora, com o consumo online aumentando, as pessoas também se sentirão mais confiantes em adquirir um carro pela internet.

A era das vendas digitais de automóveis pode ser uma solução para o setor automotivo, principalmente nesse momento em que as projeções ainda são muito voláteis. Nem mesmo os representantes do segmento ousam estimar qual será o impacto definitivo do Coronavírus na cadeia automotiva brasileira — o mercado pode cair de 15% a 60%, dizem algumas consultorias.

Mas o que é possível dizer hoje? Esse consumo digital será mesmo uma tendência no Brasil? E o que as concessionárias devem fazer para se adaptar a este cenário? Continue lendo para saber!

vendas digitais de automóveis
Fonte da imagem: 9 clouds

Entendendo o comportamento de consumo

O primeiro passo é, claro, compreender como o digital está afetando o comportamento de consumo das pessoas. 

Fazer um test drive e assinar a papelada sempre foram citados como os principais motivos pelos quais compradores de carros iam até às concessionárias — apesar de não gostarem da experiência.

Mas diversos avanços na contratação eletrônica estão tornando essa visita desnecessária, dependendo da marca. Nos Estados Unidos, por exemplo, a Mercedes-Benz oferece contratação eletrônica por meio dos revendedores.

A ameaça do vírus deverá diminuir. Mas especula-se que os consumidores já terão se adaptado suficiente ao varejo digital de automóveis para mantê-lo mesmo após o controle da pandemia.

Dados da Active Shopper Network, pesquisa realizada nos Estados Unidos, mostram que, apesar da diminuição no número de pessoas pesquisando por compra de carros online no primeiro trimestre de 2020 em relação ao mesmo período do ano passado, o Car Shopping continua à medida que os compradores aumentam o uso de internet em casa. 

Como muitos dizem, voltaremos ao normal após essa pandemia. Mas não será o normal que conhecemos. 

No que diz respeito às empresas, muitas estão sendo obrigadas a passar, neste momento, pela tão falada Transformação Digital, que deixou de habitar os livros para ser caso de vida ou morte nas empresas. 

Diariamente, nas redes sociais, vemos casos de concessionárias se reinventando para manter as vendas e os serviços girando. Nos Estados Unidos, por exemplo, a concessionária Peterson Toyota anunciou, no dia 18 de março, que estava oferecendo duas opções de compra para veículos: compra na loja, em horário agendado, ou compra online. 

Fonte da imagem: Pratical Ecommerce

Neste último caso, os consumidores podiam percorrer a maior parte do processo de compra na internet, incluindo uma oferta de troca e a solicitação de financiamento. Os testes e a papelada poderiam ser entregues na casa ou no trabalho do consumidor.

Diante de tantos exemplos, podemos dizer que ainda existem impeditivos para as vendas digitais de automóveis? Impeditivos, não. Mas o setor automotivo precisará encarar alguns desafios se quiser que esse novo modelo realmente funcione no Brasil.

Quais os desafios das vendas digitais de automóveis no Brasil?

1. Gerenciar novos serviços

O primeiro desafio é a gestão dos diferentes serviços que começaram a surgir nas últimas semanas como forma de adaptar o varejo automotivo à pandemia. De teste drive delivery aos posts nas redes sociais oferecendo test drive ou atendimento por live, já apareceu de quase tudo. 

Essas não são iniciativas ruins, mas é importante que concessionárias e revendedores estejam atentos para identificar quais canais realmente têm surtido efeito. Lembre-se: apesar de este ser um período propício aos testes de novas estratégias e abordagens, é preciso comparar os resultados e saber se essas ações realmente estão ajudando a esquentar a carteira de clientes e fechar novos negócios. 

Em meio à crise, é muito comum olharmos para o concorrente ou para uma referência e desejarmos aplicar, da mesma maneira, o que já deu certo. Mas é nesse momento que você deve se perguntar: isso realmente faz sentido para o meu negócio e o meu público?

2. Dar fim às filas de atendimento

Outro grande desafio é a melhoria do atendimento digital. De acordo com dados da Phonetrack, empresa de call tracking parceira da AutoForce, cerca de 16% das ligações realizadas para concessionárias eram perdidas antes da pandemia.

Durante a primeira onda de fechamento do comércio, na segunda quinzena de março, o índice de ligações perdidas chegou a incríveis 23%.

Esse é um fatores que impacta negativamente a experiência do cliente. Nesse momento, além de estar disponível nas redes sociais, redirecionar as ligações realizadas para a concessionária para os celulares dos gestores ou dos vendedores é uma ação importante para melhorar o atendimento e o relacionamento com o consumidor. 

Afinal, a última coisa que o consumidor quer nesse momento é preencher um formulário no site que nunca terá resposta. 

3. Definir os canais pelo ROI

Este momento também tem exigido de diversos negócios a readequação das finanças. Isso significa, principalmente, saber onde você tem investido e quais canais estão dando resultados.

Não quer dizer, no entanto, corte total dos custos de marketing. O alinhamento da operação quer dizer investir em canais que estão gerando retorno do investimento (ROI). Esse deve ser o único critério de escolha, por enquanto. 

como manter minha concessionária durante o home office

4. Reduzir burocracia e papelada

Alguns estados ainda poderão exigir papelada física para garantir a venda do veículo — o que é praticamente impossível, uma vez que muitos Departamentos Estaduais de Trânsito (Detrans) estão fechados.

Uma alternativa é acelerar boa parte da papelada a partir de formulários eletrônicos e contratos digitais. O importante,  nesse momento, é adiantar ao máximo a burocracia, garantindo que o negócio possa ser fechado o mais rápido possível após a quarentena. 

5. Pensar os custos de entrega

Nos Estados Unidos, a Carvana, uma das maiores empresas de seminovos americanas, entrega os carros usados na porta do consumidor no dia seguinte à compra

Fonte da imagem: Pratical Ecommerce

Alguns revendedores já estão atuando com serviços delivery no Brasil, o que é um grande passo em direção ao comércio eletrônico no varejo automotivo. No entanto, concessionárias menores precisarão colocar na ponta do lápis os custos associados desse serviço.

6. Concorrer com novos players

Há a possibilidade de que, com a expansão das vendas digitais de automóveis no pós-crise, a concorrência aumente para os negociantes de carros tradicionais. Isso porque qualquer empresa ou pessoa física poderá adquirir os carros em leilões e começar a vender veículos online — a exemplo do que já ocorre com diversos perfis no Instagram, por exemplo. Para não falar no crescimento de grandes marketplaces baseados em portais verticais, como OLX e Mercado Livre. 

Então não haverá lugar para as concessionárias no comércio digital?

Haverá, sim. Nesse novo cenário, a competitividade também levará ao desenvolvimento de novos serviços e uma melhoria na qualidade do que é oferecido ao consumidor. Além disso, as concessionárias ainda possuem uma carta na manga, que é a prestação de serviços das marcas, o que já as coloca à frente de diversos concorrentes.

7. Atualizar as ferramentas digitais

Muitos dealers ainda enfrentam muita dificuldade quando o assunto é a atualização dos conteúdos online — principalmente aqueles vinculados ao site. Nesse momento de mudança, ter um showroom responsivo, customizável e, o que é mais importante, disponível com informações atualizadas para o consumidor é essencial.

Além disso, é impensável manter um showroom digital que não tenha integração com o CRM e o estoque da concessionária, ferramentas necessárias ao dia a dia de qualquer vendedor.

Nesse momento, é essencial que sua concessionária possuam uma ferramenta digital que ofereça funcionalidade e design, treinamento e, claro, boas práticas e estratégias de marketing. Certifique-se de que a solução escolhida experiência real no setor automotivo.

Conclusão

Aparentemente, a era das vendas digitais de automóveis já chegou. Se antes ela parecia apenas um tópico das inúmeras palestras e livros sobre Transformação Digital, agora ela uma questão de vida ou morte para inúmeros negócios. 

A concretização desse novo modelo de negócios é, inclusive, algo de interesse de muitas montadoras. Nos Estados Unidos, a Porsche está ajudando seus revendedores a ingressarem em um programa piloto digital, reduzindo as taxas de participação Agora, a montadora reembolsará as concessionárias a uma taxa fixa pela entrega de veículos novos.

No Brasil, algumas montadoras também já têm atuado em prol da digitalização da rede. A FCA Latam, por exemplo, iniciou o Projeto Grow para as concessionárias Jeep, focado em oferecer soluções de marketing digital homologadas e com reembolso da montadora.

Neste momento, toda e qualquer ação que promova as vendas digitais de automóveis não estará apenas promovendo o surgimento de um novo modelo de negócios e a continuidade da economia. Estará, também, ajudando um pouco os consumidores a atravessarem esse momento tão estranho e trazer mais da “normalidade” que todos nós esperamos.

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Sobre o Autor

Tiago Fernandes
Tiago Fernandes

Administrador, sócio-fundador e CEO da AutoForce.

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